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Nada é Por Acaso

(Disponível também em áudio.

Para ouvir, clique aqui)

     Eu caminhava apressada na passarela. Era o dia mais importante da minha vida. Faltavam vinte minutos para a hora da entrevista. Maldita a hora em que meu telefone descarregou! Não consegui acordar sem o despertador.

     Cheguei à catraca da estação, apresentei o cartão. "Saldo insuficiente".

     Corri para a bilheteria. Escutava, desesperada, o trem que se aproximava. A recarga demorou uma eternidade!

     Passei a catraca, corri, mesmo com salto. O trem estava lá. O toc-toc de meus sapatos ecoava pela plataforma quando as portas se fecharam.

     — Espere! — gritei. O condutor não ouviu.

     Alguns passageiros me olharam com pena. Outros balançaram a cabeça, em reprovação pelos palavrões que eu disse. Eu aguardei aquela entrevista por tanto tempo! Suspirei. Conferi o horário do próximo trem. Não daria mais tempo de chegar. Eu não conseguiria avisar do atraso, pois não carregara o celular.

     Sentada na estação, cabisbaixa, sem saber o que fazer, escutei passos se aproximando.

     — Val?  — disse ele.

     Era Cris. Um garoto que estudou comigo no segundo ano. Mas estava diferente. Com barba, óculos e um terno muito chique. Diziam que ele gostava de mim, mas não dei bola, na época.

     — Olá! — respondi.

     Conversamos. Ele me surpreendeu. Parecia muito mais culto e interessante que na época do colégio. Em vinte minutos, embarcamos no trem. Não esperava mais ser aceita na entrevista, apenas queria ficar com o Cris por mais alguns minutos. Não tinha muitas expectativas, mas quem sabe? Aquele dia poderia ser ótimo, ainda que de uma maneira inesperada.

     Comentei sobre meu atraso e ele me ofereceu seu celular. Quando disquei o número, apareceu na tela: "Chamando Escritório".

     — Você trabalha na Souza e Campos? — perguntei.

     — Sim. Sua entrevista é lá?

     — É. 

     Que surpresa, a minha! E que sorte!

     Com a ligação, descobri que a gerente também se atrasara. Esperançosa, pedi que a telefonista avisasse que eu estava a caminho. Cris parecia estar contente por mim.

     — Tenho alguma influência na empresa — disse ele. — Posso recomendar seu nome. Tenho certeza de que você será uma ótima colega de trabalho!

     Agradeci o apoio, devolvi o celular e nos levantamos para desembarcar. Além de estar bem mais confiante que conseguiria a vaga, ele ainda me convidou para almoçarmos juntos. 

     Pensando bem, que bom que me atrasei!

(*Fim*)

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